quinta-feira, 1 de novembro de 2018

PEQUENOS CONTOS - RUVENS, ARAUTO DAS LÂMINAS

A batalha havia se intensificado na campina Susanita. O exército cinzento de Kyteria entrara nas cidades do Planalto, saqueando, destruindo as catedrais e matando inocentes para abastecer suas fileiras de mortos-vivos. Ao saberem da investida, os reis do Planalto retiraram-se para as cidades fortificadas e resistiram até ao amanhecer. Seguiram-se horas aterradoras de intensa batalha. O exército cinzento parecia incansável ao lançar-se contra a gigantesca muralha de Susana, a cidade fortificada mais imponente do Planalto. Cada soldado susanita abatido no chão representava um novo soldado cinzento a cerrar fileiras contra os homens acuados.

As buzinas já haviam soado há algumas horas, replicando às cidades vizinhas o pedido de socorro. As aves emissárias já haviam alçado voo em direção à cidade dos paladinos, buscando o auxílio de Ruvens, um clérigo arauto, mas até aquele angustiante momento não havia esperanças para os homens, a não ser que intensificassem a defesa contra a ofensiva cinzenta. Foi no romper da alvorada que as armaduras platinadas começaram a refletir a luz do sol nascente, no horizonte. Eram os paladinos de platina que cavalgavam rapidamente ao socorro de Susana. Ruvens recebera o pedido de socorro e convocara os cavaleiros platinados à batalha.
Ruvens comandava os homens na peleja contra os cinzentos de Kyteria, que cresciam exponencialmente à medida que os necromantes traziam os mortos de volta à batalha. O clérigo buscou afastar-se do centro da peleja, junto de alguns cavaleiros mais próximos, e pôs-se a clamar. A partir dessa hora o céu começou a tornar-se em vermelho. A vermelhidão das nuvens debaixo do sol era tão intensa que toda a região parecia estar banhada em sangue. Incontáveis raios e trovões começaram a castigar a terra e a romper os céus por algumas horas. Algo terrível parecia estar prestes a acontecer, embora os exércitos permanecessem aguerridos em batalha.
Maldito seja! Arauto miserável, você pagará caro pela sua prepotência! Como ousa atentar contra o exército de Kyteria?! - Dizia em tom belicoso, em alta voz, Theodor, um dos oficiais comandantes de Salazar, o Necromante.

Ruvens encontrava-se em uma clareira em meio à peleja, há algumas centenas de metros do centro da luta. Ele permanecia com os olhos fitos nos céus, e clamava em alta voz, nas línguas antiquíssimas dos homens, enquanto um destacamento dos paladinos guardava seu perímetro contra os ataques inimigos.
De repente, um ensurdecedor estrondo! Um trovão tão intenso foi ouvido que atordoara a todos. Era como se a abóbada celestial tivesse sido estilhaçada em grande explosão, e então despencasse seus inúmeros fragmentos na forma de lâminas sobre o extenso campo de batalha numa tempestade voraz.
As lâminas começaram a cair dos altos céus em meio a uma chuva torrencial de sangue e enxofre. Era a visão terrível e gloriosa do Flagelo das Lâminas.
Os homens estarrecidos tentavam abrigar-se sob seus escudos enquanto as criaturas malignas eram consumidas pela fúria dos céus.
O cheiro era insuportável no local, e o solo outrora verdejante, agora impregnado pelo sangue. As pilhas de corpos começaram a erigir-se à medida que o açoite divino era alçado contra o exército dos mortos. Temível era aquele cenário.
Ao olhar para o vale após a destruição, Ruvens dirige-se aos cavaleiros:
Ainda lhes restam invocações. É necessário incinerar os corpos para que não se levantem no romper da noite e tragam mais assolação ao Planalto, e encontrem o que procuram tão obstinadamente. A essas horas Kyteria já foi alertada por seus lacaios mensageiros, e Salazar poderá invocá-los antes mesmo que o sol se ponha. Incendeiem a campina Susanita homens!